Poema sobre o Silêncio da Beleza Traída
- Raphael Sousa
- 25 de mai.
- 1 min de leitura
Atualizado: 30 de mai.

Ó tu, outrora gesto santo, chama pura,
Sim, tu Beleza Traída, poema,
Que aos olhos dava luz quando o homem via o Bem,
E não temia nomear o que contemplava —
Estás agora morto, e sem nome sepultado?
Não te matou o vício, nem mão lasciva te feriu,
Mas o gelo da justiça em excesso adornada,
O decoro severo, vestido de perfeição,
Que nem se curva, nem chora, nem ousa admirar.
Ó Beleza, velada — não por tua vergonha, mas pela nossa!
Já não ousamos olhar, para que olhar não pareça usurpar;J
á não ousamos falar, para que a palavra
Não seja ouvida como laço ou artifício vil.
Que mundo é este, em que o assombro é delito,
Onde o louvor deve calar-se,
E o silêncio parece mais justo
Do que a palavra nobre, trêmula de adoração?
Andam como santos — ilesos, irrepreensíveis,
Mas ocos como túmulos jamais nomeados.
Tão limpos estão, que o calor os abandona,
Pois o fogo não habita corações fechados ao arder.
Falei — não para tocar, nem para possuir.
Cantei — como cantam os exilados sob as estrelas.
Não por tua mão, mas pela voz que perdi
Quando a Beleza passou, e ninguém se curvou, ninguém chorou.
Deixa-me agora lamentar —
Não a ti, ó forma passageira,
Mas ao mundo, que se fez orgulhoso demais para sentir
A bondade não-intencionada, o olhar devoto,
A palavra que queima
E não pede resposta.

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